Além do horizonte romance Capítulo 5

Amanheceu e Ester ajudava a filha a escolher um belo vestido, como sempre e fazer um penteado em seus longos cabelos negros.

– Filha precisamos falar sobre um assunto muito importante agora.

– Pode falar mãe.

– Sabe que seu pai e eu nos preocupamos muito e sempre quisemos o seu bem acima de qualquer outra coisa nesse mundo.

– Eu sei, mas devem pensar mais em vocês. Por que, apesar de tudo eu posso cuidar de mim mesma sozinha.

– Você pensa que pode filha, mas não tem noção das maldades desse mundo.

Ester se sentou na frente da filha e segurou uma de suas mãos que estavam ficando cada vez mais frias conforme avançavam naquele assunto.

– Nossa decisão pode parecer severa e dura a princípio minha linda, mas um dia você vai entender (respirou profundamente) quando tiver os seus próprios filhos.

– Não vou ter filhos! – Respondeu Guadalupe corrigindo a mãe.

– Hoje à noite você ficará oficialmente noiva do Gabriel.

– De jeito nenhum mamãe, (se levantou irritada) eu nunca desobedeci a senhora e meu pai, mas não admito que os dois interfiram assim no meu destino. Não quero me casar, nem com ele e com nenhum outro. Pense em como seríamos infelizes sem nos amarmos, nossa convivência seria um martírio todos os dias.

– Já está decidido e aceite que esse anel que ele te deu em seu aniversário, é de compromisso.

Guadalupe arrancou o anel do dedo e saiu correndo para fora de casa, sabia andar por aquelas terras desde pequena.

Foi ao estábulo, montou em seu cavalo e partiu sem nem mesmo guiá-lo pelo olfato antes...saiu sem rumo e chorando.

Naquela mesma manhã Atílio e o advogado conversavam sobre as terras de Leonel e os dois passeavam a cavalo.

– Sua fazenda é uma verdadeira obra de arte, um lugar perfeito para constituir morada e uma família. – Diz Josué encantado com a beleza daqueles campos.

– Fico lisonjeado com vosso elogio, mas o assunto que lhe pedi pelo telegrama, conseguiu verificar?

– Por certo que sim Atílio, esse tal Leonel não tem qualquer escritura de propriedade em seu nome. Mas se vive nesse humilde rancho a anos poderia apelar pela posse em usucapião.

– Sei do que se trata essa lei, então apesar de não ter sequer uma prova de que as terras são dele ainda pode pedir a posse pelo tempo em que vive naquele lugar. – Atílio respondeu pensativo.

– Exatamente isso.

– Eu quero aquela propriedade e estou disposto a tudo por ela Josué.

– Só se ele regularizar a posse e ao lhe vender entregar a escritura do rancho.

– Quero que o defenda e que ele fique com as terras... – Atílio sorri.

– E depois disso? – Questiona o advogado bem curioso.

– Depois eu posso tentar tirar dele em uma mesa de jogo!

Ao olhar par ao lado Atílio viu Guadalupe cavalgando sozinha, dessa vez não estava indo em direção a cidade.

– Só pode ser o meu dia de sorte! – Atílio suspirou e sorriu, era tão incrível como seu corpo reagia a presença dela involuntariamente.

– O que disse? – Perguntou Josué.

– Se importa em voltar para a mansão sozinho?

O advogado percebeu que ele queria seguir aquela bela amazona.

– Claro que não, vá tranquilo atrás de sua prenda Atílio.

Ele sorriu e fez seu cavalo galopar com maior velocidade, até alcançar Guadalupe.

– O que faz assim tão sozinha em minhas terras? – Pergunta ele olhando de cima abaixo, montada em seu cavalo e ainda com lágrimas nos olhos.

– Senhor Atílio, me desculpe por ter invadido sua propriedade. Calculei errado a distância e achei que ainda estava perto de casa.

– Reconheceu tão facilmente a minha voz, seu cavalo é um corcel muito alinhado. – Diz ele e no fundo estava a se referir a ela.

– Sua voz é grossa e imponente e eu ganhei Raio de sol do meu padrinho quando fiz dez anos de idade.

– Sem dúvida foi um lindo presente, mas apesar de bela como sempre, você não parece feliz. Está com os olhos vermelhos e quem teve a audácia de te fazer chorar?

– Me desculpe senhor, mas não nos conhecemos para tratarmos de certos assuntos...não quero ser descortês.

– O padre me conhece bem...sabe que sou confiável e você também pode e deve confiar em mim, as vezes desabafar ajuda com a dor. – Ele solta as rédeas e entra na frente do cavalo dela com o seu.

– É que meus pais.... – Ela não consegue segurar a dor e chora.

– Há algo de errado com eles? Diga e eu juro que farei tudo o que puder para ajudar.

– Eles vão me casar com Gabriel.

– Com aquele rapaz que foi tão agressivo comigo no jantar? Eu não diria que ele é um bom candidato a seu marido pelas impressões que tive. – Atílio irritou-se e mudou o tom de voz.

– Gabriel não é agressivo...é um homem bom e trabalhador. – Respondeu Guadalupe, apesar de não o amar a ponto de se casar, sempre o estimou.

– Falando assim, me parece que vai aceitar muito fácil esse destino que lhe impuseram.

– Está enganado, não vou me casar com ele e nem com ninguém mais.

– E por que essa recusa tão grande em se unir a alguém? Tem medo? – Ele segurou o riso, adorava jogar com o medo das donzelas.

Ele olhava para os seios dela enquanto o galope do cavalo, os faziam mover. Já podia imaginar a maciez de ambos e sua boca se enchia de ganas

– Eu decidi que quero me entregar a Deus, ser freira e estou criando forças para dizer isso a ele e ao meu pai.

– Você ainda é jovem e por que não pensa melhor antes de tomar uma decisão assim? Seria uma vida de eterna clausura! – Atílio nesse momento entendeu o motivo de tanto medo do sexo oposto, mas não iria permitir que ela escolhesse um destino como esse.

– Eu já decidi isso e eles terão apenas que aceitar.

Seria um grande desperdício, uma beleza tão grande como a dela se acabar na clausura de um convento. Eu a olhava me perdendo em seus lábios naturalmente rosados e seus olhares que apesar de parecerem perdidos, iam de encontro aos meus deixando-me sem palavras.

– Entendo sua decisão como a confirmação de minhas suspeitas. – Diz ele se aproximando do cavalo dela.

– Que tipo de suspeitas?

– Que você não ama esse rapaz.

– Sim eu amo, mas apenas como a um amigo ou irmão. É um tipo de sentimento diferente daquele que se deve ter para que um casal compartilhe a vida, ou mesmo uma cama.

Eu sorri, Guadalupe não poderia ver e mesmo que pudesse, acho que seria difícil segurar tal reação espontânea.

– Por que não vamos até a cachoeira e você me conta mais sobre sua decisão de entregar a vida ao senhor? – Propõe ele, olhando para os lados se certificando que ninguém os observava.

– Não sei, não saio assim com estranhos. Me perdoe, mas não nos conhecemos bem ainda. – Ela recuou com o cavalo.

– Achei que confiasse em mim? É apenas um passeio, prometo que te levo de volta depois.

Agarrei as rédeas do cavalo dela, fazendo ele seguir o meu e fomos devagar até perto do rio. Ela ficou ofegante, estava assustada e confesso que achei isso ainda mais excitante.

Eu ouvia o som da cachoeira, não sabia se eu podia confiar naquele homem desconhecido. Porém, aquele lugar me dava paz e naquele momento eu precisava muito disso, senti ele me puxar pela cintura me descendo do cavalo e ficou um tempo respirando perto do meu rosto. Mas eu me afastei e quase tropecei em algo no chão.

– Devagar preciosa, aqui tem uma pedra! – Respondeu ele fazendo de tudo para que aquele toque nela, durasse mais.

Ele me ofereceu o braço e fomos devagar andando por aquele lugar que a julgar pelo tempo que eu cavalgava, era afastado.

– Acho que é melhor eu voltar. – Diz ela com medo e arrependimento por ter concordado em estar ali sozinha com ele.

– Não se preocupe, depois eu te levarei de volta para casa em segurança.

– Não fica bem a gente aqui sozinhos e no meio do nada, me leve agora por favor. – Ela deu alguns passos, Atílio segurou em sua mão.

Estávamos no lugar ideal e longe de tudo, a ocasião perfeita para possuir aquela garota em cima das pedras daquela cachoeira, mas não...ainda não!

– Não quero que fique assustada por estarmos aqui sozinhos, então vamos até a minha casa e toma um café comigo. – Sugeriu ele.

– Sim, mas vamos sair desse lugar, por favor!

Ajudei ela a montar me aproveitando dos toques que pude lhe dar e segui junto com o meu cavalo até a mansão.

– Essa é a... – Perguntou Amélia muito surpresa com aquela visita.

Fiz aquela maluca da Amélia se calar antes de falar demais e espantar a minha ilustre visita.

– Nos conhecemos no jantar de sua crisma, muito prazer em rever a senhorita. – Diz ela pegando na mão de Guadalupe e levando-a até o sofá.

– Prepare um café e um lanche especial... – Atílio se senta ao lado dela.

– Lanche? mas já é quase...

Não queria que Guadalupe tivesse noção do tempo, quando a encontrei já era tarde e se tudo desse certo para mim iríamos ficar juntos até o anoitecer.

Ela estava preocupada, quase não tocou na comida e o todo o tempo pedia para ir para casa.

– Aprecio sua hospitalidade e atenção senhor Atílio, mas devo ir agora para casa.

Fiquei sempre mudando de assunto para segurar ela mais tempo comigo.

– Quer aprender a tocar piano? – Propõe ele com um sorriso e dessa vez sincero e sem malícia.

– Eu não poderia...

Ela sorriu tímida.

– E por que não? Muitos deficientes visuais conseguem fazer muitas coisas quando praticam e se dedicam.

Fui até ela e a puxei delicadamente pelo braço, nos sentamos um ao lado do outro em frente ao piano. Peguei sua mão pequena e com ela dedilhei algumas notas, ela sorriu.

– Entendeu agora, você pode conseguir tudo o que quiser nessa vida... absolutamente tudo!

Toquei uma sinfonia melancólica e ao mesmo tempo romântica, Guadalupe suspirava e sorria. Levei sua mão fria pelo nervosismo até meus lábios e a beijei. Ela ficou visivelmente constrangida mesmo aquele carinho sendo tão simples.

Amélia nos olhava de longe e ao mesmo tempo que sorria pelas minhas investidas, temia onde elas poderiam terminar.

Ouvi o som dos animais noturnos, já devia ser muito tarde e meu coração acelerou de imaginar na angústia que meus pais poderiam estar sentindo por eu ter saído a cavalo sozinha a tanto tempo.

Poderiam achar que fui atacada por um animal ao me perder e tantas outras coisas ainda piores.

– Deus...já é noite, meus pais devem estar preocupados por que não voltei para casa.

Ela se levantou do banco do piano, estava desesperada para ir embora.

– Me desculpe é que quando estou contigo eu perco a noção do tempo, vou te levar para casa. Vamos no seu cavalo e eu volto para casa caminhando depois. – Propôs Atílio oferecendo o braço para saírem.

A ajudei a montar e fui por trás envolvendo seu corpo pela cintura, aproveitando todo o caminho para sentir seu cheiro de mulher e seu calor.

Eu sentia os lábios dele me tocarem a nuca, cheirava meus cabelos. Atílio me queria como mulher e eu não sabia dizer se aquilo me dava medo ou desejo de descobrir até onde iria chegar.

Assim que adentramos o rancho já vi os pais dela na porta de casa e passei a me comportar um pouco melhor, estavam junto com o iludido noivo e o pai dele.

– Seus pais e seu noivo te esperam e pela cara não estão muito contentes. – Avisou Atílio para que ela se preparasse.

Nos aproximamos e aquele imbecil aspirante a marido a tirou do cavalo aos berros.

– O que fazia com esse homem o dia inteiro? E ainda mais assim agarrado ao seu corpo? – Gritou Gabriel segurando forte no braço dela.

– Ficamos preocupados filha! – Diz Ester abraçando a filha.

– O que fez com ela? – Gritou Leonel olhando nos olhos de Atílio.

– Por favor já chega de gritos! Ficamos apenas conversando e perdemos a noção do tempo, nada aconteceu e já estou em casa Atílio vá em paz e obrigada por me trazer em segurança. – Tudo o que ela menos queria era uma confusão, mas já havia causado e a guerra estava decretada entre Atílio e Gabriel.

Eu sorri e desci do cavalo e entreguei as rédeas para a mãe dela que me olhava de maneira insistente.

– Foi um prazer estar ao seu lado Lupe, sempre que quiser...minha casa estará aberta para você. – Disse Atílio calmamente e deixando o rival ainda mais furioso.

Saí caminhando satisfeito e tentando disfarçar o meu deboche vendo o ciúme daquele desqualificado, não quis sustentar o que ela havia dito...eles que pensassem o que quisessem.

Ouvi passos acelerados se aproximarem de mim.

– Eu não estou de brincadeira, se afaste da minha noiva ou eu acabo com você! – Diz Gabriel e os dois se encaram de frente.

Me aproximei do rosto dele e dei o meu recado apenas para que ele ouvisse.

– Pois trata de prender bem sua potranca ou vai me pegar montando-a em breve por esses campos.

– Desgraçado! – Arfou Gabriel.

Levei um soco dele, se não fosse o pai o agarrar acho aquela luta iria bem longe.

Eu não podia revidar e me mostrar agressivo na frente dos pais dela, peguei meu chapéu do chão e fui andando ainda que minha vontade fosse quebrar aquele moleque.

Cheguei em casa com um ferimento pequeno na boca e joguei o chapéu no chão.

– O que foi isso filho? – Pergunta Amélia tentando tocar o rosto dele.

– Aquele borra botas se acha dono dela eu devia ter quebrado a cara dele inteira, Guadalupe só será de outro se eu não existir, antes não!

– E o que você fez com ele?

– Nada, por que ela e os pais estavam na minha frente, mas a minha vontade era de arrancar os olhos dele e dar aos porcos.

– E Guadalupe? – Amélia sabia que Atílio não a deixaria assim sem tentar algo.

– A levei para casa.

– Mas....

– Se é o que quer saber ela está inteira, ainda. Acho que essa é a garota mais difícil que já tentei possuir, mas quando a tiver farei valer a pena cada segundo de ira que estou passando. – Ele fechou o punho, ter essa mulher era agora uma questão de honra.

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