Filha da Lua romance Capítulo 5

A viagem foi mais longa do que eu imaginava. Não aguentava mais ficar sentada e minha mãe já me ligou pedindo pra voltar. Mas, aqui estou eu! Em um quarto bem maior do que eu tinha, com vários ursos de pelúcia, que particularmente eu amo, um banheiro enorme com uma banheira que, facilmente, poderia ser usada como piscina. Sol amaria tudo isso.

Pensar nela me faz ficar triste. Somos amigas há tanto tempo e não nos despedimos direito... Quem sabe um dia voltemos a nos falar.

Assim que chegamos, meu pai tinha algumas coisas para fazer e saiu junto com Gastón. Então, aproveito para conhecer a casa.

A cozinha é enorme, para falar a verdade a casa em si é um luxo. Os quartos são todos trancados, como se tivesse alguma coisa de valor guardada dentro deles. Depois de mexer em tudo, subo para meu quarto e fico a olhar para minha nova cidade: Bonanza.

Eu nunca imaginaria que existiam lugares assim. Essa cidade é, basicamente, no meio de uma floresta enorme. Quando chegamos, vi várias crianças brincando na rua enquanto suas mães conversavam e vovozinhas tricotando enquanto o sol se escondia atrás das árvores altas que até pareciam tocar o céu.

Por ser rodeada de árvores, a cidade tem um clima frio. Logo que cheguei aqui percebi que a diferença entre o inverno de Torstal e Bonanza é enorme.

Arrumo minhas roupas no armário e escuto o barulho do carro entrando na garagem. Rapidamente termino de arrumar tudo e desço. Encontro papai na cozinha.

— Chegou ... – digo assim que entro na cozinha.

— Sim. Eu fui na escola e fiz sua matrícula... Você começa amanhã.

— Mas já? Pensei que ficaria alguns dias de folga... – que pena, tinha até esquecido essa parte.

— Nada disso garota! Você deve ir à escola sim, é seu penúltimo ano. Você precisa se esforçar ou terá que voltar para sua mãe...

— Ok ... eu vou. – não quero voltar. Quem sabe um dia, mas agora não. – Cadê o Gastón?

— Deve estar chegando já. Ele tinha que resolver alguns assuntos pessoais.

— Humm... – me sento na mesa e fico observando meu pai cozinhar. – O que está fazendo pra gente jantar?

— Macarronada.

— Amo! – digo sorrindo.

As horas passaram e não vi o Gastón chegar. Talvez ele vá passar a noite fora, ou sei lá. Não entendo porque estou pensando sobre isso. Olho pela janela do meu quarto e vejo a enorme floresta que começa no fundo da casa. Amanhã quando eu chegar da escola vou dar uma olhada nela. Eu amo ler no meio do silêncio.

Ouço meu celular tocar na minha cama.

— Alô? Mamãe?! – digo me deitando na cama.

— Filha, minha querida filha... Já quer vir embora, não é? – ela deve estar bêbada – Eu te falei pra não ir.

— Mamãe, eu só estou aqui há um dia! E eu gostei daqui, não sei o que você tem contra essa cidade maravilhosa.

— Se eu fosse você, viria embora. Filha, se você ficar mais de dois dias aí, não poderá partir! Me escute… depois não adiantará me ligar chorando.

— Ok mamãe. Sei que você deve estar triste por eu ter te deixado, mas eu não vou voltar.

— Você é quem sa...

— Mamãe?

- ... ...

A linha estava muda. Deve ter dormido no celular. Amanhã eu ligo para saber como ela está.

Desligo meu celular, tenho que dormir. Amanhã, infelizmente, já tenho que ir à escola. Eu pensava que esse processo de matrícula demorava um pouco mais, mas pelo que pude ver, é mais rápido do que esperava. Sinto meus olhos pesarem e me vejo caindo na escuridão dos meus sonhos.

De repente, estou no meio de uma floresta rodeada por uma escuridão que me dá medo. Ando sem saber qual direção tomar, escuto passos, mas não sei dizer de qual direção vem o som.

— Estela… – essa voz... Eu conheço! Já sonhei com ela – Olá, Estela! Obrigado por antecipar meus planos ...

— Quem é você? – Pergunto enquanto tento enxergar alguma coisa nessa escuridão.

— Eu sou... O seu pior... Pesadelo... – Assim que ele termina a frase, ouço sua risada que me deixa mais nervosa ainda.

Sinto meu coração acelerar. Tento correr ou gritar, mas nada adianta. Não consigo me mover... O que tem de errado comigo? Estela, isso é apenas um pesadelo! Isso não é real! Não adianta. Não consigo me controlar.

— Dê lembranças ao seu pai. Em breve iremos nos reencontrar, como nos velhos tempos... – Ele diz e sinto que se foi. Não sei exatamente como, mas sei que ele já não está mais aqui.

  

  Acordo assustada, suando frio. Um vento gelado entra pela janela, posso ver a lua que ilumina a madrugada. Me sento na cama e a voz daquele homem ainda soa na minha cabeça. Quem será que era? Não é a primeira vez que eu tenho esse pesadelo.

Olho no celular e são quatro da manhã, a casa está mergulhada no silêncio. Me aproximo da janela e vejo uma pequena luz que anda no meio da escuridão da floresta, subindo, como se fosse uma lanterna ou uma lamparina. A claridade da luz é meio amarelada.

Quem seria o louco de andar no meio de uma floresta, durante madrugada, se expondo a tantos perigos? Só pode ser louco mesmo. Volto para cama, daqui a pouco tenho que levantar mesmo, melhor eu dormir.

Dessa vez não tenho nenhum pesadelo ou algo do tipo.

Acordo com alguém batendo na porta.

— Quem é? – digo sem nem mesmo abrir meus olhos.

— Levanta, Estela. É hora de ir para a escola... – Abro meus olhos assustada e por um minuto fico tentando assimilar tudo o que vem acontecendo comigo e onde eu estou.

Olho para o quarto e lembro que agora tenho uma nova casa, nova escola e inclusive, hoje é meu primeiro dia.

— Mais cinco minutos... – Digo rolando na cama.

Olho pela janela e vejo o sol nascendo, vários passarinhos cantam com o novo dia que se inicia. Me levanto e vou direto para o banheiro, tomo um banho rápido e coloco uma calça jeans meio rasgada junto com uma camiseta, moletom vermelho, meus tênis e desço.

— Bom dia! – Digo entrando na cozinha.

— Você está atrasada. Não vai dar tempo de tomar café, vamos! – Diz meu pai saindo para a sala.

Sério? Ficar sem comer? Pego uma maçã na fruteira e o sigo até o carro.

— A escola é muito longe? – Pergunto assim que entro no carro.

— Não. Mas, como é o seu primeiro dia de aula, eu vou te levar.

— Hum. – Murmuro ligando meu celular.

O caminho, como meu pai disse, não é longo e vemos vários alunos caminhando para a escola. O uniforme das meninas consiste em camiseta polo branca, uma saia rodada bege e meia três quartos.

Meu pai para em frente a escola. E que escola! É enorme! Deixo minha boca aberta, sem querer.

Três prédios, um do lado do outro, e em cada, há um corredor com os nomes das salas de cada prédio. Eu já sei que o meu é o terceiro.Vários alunos correm para seus determinados prédios.

— Gostou? – pergunta meu pai me olhando.

— Amei! Espero gostar dos professores também. – Digo descendo e fechando a porta.

— Você vai gostar... Agora vá. – Assim que fala, ele se vai me deixando aqui fora encarando essa escola enorme.

— Vamos, força, Estela. Você consegue! – Estou nervosa, mas vai dar tudo certo.

Passo pela porta do prédio e vejo uma escada que dá acesso ao segundo andar. Aqui embaixo vejo várias salas de aula. Mas, e agora? Qual é a minha?

— Olá! – diz alguém atrás de mim.

Assim que viro, vejo uma garota loira, não muito alta, usando óculos e com uniforme da escola trazendo um sorriso no rosto.

— Oi... – digo meio nervosa.

— Você deve ser a aluna nova, acertei? Eu sou a Anna! Eu ajudo os alunos novos a conhecer a escola no primeiro dia de aula.

— Ah... Claro. Eu sou a Estela. Estela Brancy.

— Você é a filha do Mack Brancy? – perguntou arregalando os olhos.

— Sim. Você conhece meu pai?

— Todos conhecem seu pai – diz sorrindo – Ele é muito respeitado por aqui. Vamos.

— Eu não sei qual é a minha sala... Meu pai esqueceu de me avisar.

— Ah... Eu tenho aqui. – diz olhando para uma prancheta – Vamos ver... Estela... Aqui! Achei! Estela Brancy, 2º D. É a minha sala também! – diz toda animada.

— Que legal... – digo meio envergonhada.

— Ok. Venha, estamos atrasadas. – diz me puxando para o segundo andar.

O segundo andar é igual ao primeiro, com várias salas e muito barulho. Seguimos para a última sala e paramos em frente da mesma.

— É aqui. Agora temos que rezar e entrar...

— Rezar?

— Longa história... – diz batendo na porta.

 

   Assim que a porta se abre, uma professora de pequena estatura nos encara. Seus cabelos são curtos e pretos, pele morena e seus olhos meio esverdeados.

— Anna! Está atrasada! – diz a professora nos encarando. – E você? Quem é?

— Ela é aluna nova, professora Márcia! – diz Anna de cabeça baixa.

— Ok. Da próxima, ninguém entra. Vou liberar apenas dessa vez.

— Obrigado! – falamos juntas.

    

Assim que entro na sala, percebo vários alunos me encarando. Sinto meu rosto esquentar... Que vergonha!

— Pessoal! Essa é a nova colega de vocês. Seu nome é? – fala a professora fazendo todos cochicharem.

— Sou Estela Brancy ...

Ouço todos se calarem e arregalaram seus olhos ao ouvirem meu sobrenome.

— Você é a filha do Mack Brancy? – pergunta a professora me encarando.

— Sou. Eu me mudei ontem para cá... – digo meio envergonhada.

— Sente-se onde quiser. – diz ela apontando para as carteiras vazias.

     

Me dirijo para a última carteira da segunda fileira e me sento. Vários alunos ainda continuam me encarando.

       A aula passa rapidamente e me vejo na hora do intervalo. Anna quis andar comigo, então fomos ao refeitório e pegamos um lanche cada uma. Parece que a notícia de eu ser a aluna nova correu rápido. Vários alunos me encaram. Alunos que nem estão na minha sala.

— Hoje você é o centro das atenções. – diz Anna sorrindo – Stefanny deve estar se mordendo.

— Quem é Stefanny?

— Uma garota que se acha a última bolacha do pacote. Ela é, tipo assim, a melhor em tudo e de todas. E, como ela namora o Gastón, toda garota tem inveja dela.

— Espera aí! Ela namora o Gastón? O que mora na minha casa? – pergunto encarando ela.

      Como assim? Ninguém me falou nada! O Gastón é um gato! E bota gato nisso!

     — Falando no diabo… – fala Anna chamando minha atenção.

     

Olho para frente e vejo uma garota morena, muito bonita, vindo em nossa direção enquanto é seguida por outra garota.

— Essa aí? – pergunto apontando para a garota.

— Sim! E não aponta… – Anna abaixou a cabeça e sussurrou entre dentes – Ela ama uma briga, não dê bola para o que ela disser.

— E aí, Anninha? Amiga nova? – Stefanny se aproxima, sentando em nossa frente. Percebo  vários alunos cochichando – E aí, vadiazinha. Como você se chama?

     Essa pergunta, direcionada a mim, me faz querer voar nessa garota. Quem ela pensa que é para me chamar de “vadiazinha"? Tento manter a calma, hoje ainda é meu primeiro dia de aula. Tenho que aguentar.

— E então? Você tem nome? – insiste a garota que está junto de Stefanny.

      Essa garota tem o cabelo cacheado, e tenho que admitir, é extremamente bonito. Deve ter 1.79 de altura, maior que todas as garotas que eu vi aqui.

— Eu sou Estela. – digo ficando em pé – E vocês, quem são?

     Assim que me levanto, vários alunos abrem a boca em um "O" silencioso. As duas garotas, antes sentadas em nossa frente, também se levantam. O que foi que eu fiz?

— Olha, Laís... Parece que a cadelinha tem coragem para nos enfrentar - diz Stefanny dando uma gargalhada forçada.

— Não é isso, Stefanny. Ela deve estar nervosa com a nossa beleza.

  

   Tipo, sério isso? Elas se acham tão belas assim? Tudo bem que são bonitas, mas não é de se exagerar tanto assim.

— Nervosa? – digo rindo – Se você falasse que era devido a sua feiura, eu até concordaria. Mas, beleza? Vocês só têm um ego muito elevado.

  

   Todos do pátio começam a gritar e tirar sarro das duas.

— Então é assim? Mal chegou e quer mostrar que manda? Pois então vamos te ensinar que aqui, quem manda somos nós!

— Ela não quis dizer isso. – fala Anna entrando na minha frente – Ela ainda não conhece como funcionam as coisas por aqui. Perdoem ela, eu vou conversar com ela.

Percebo que Anna está super nervosa. Tá, eu posso não ser bonita, mas sou boa de briga. Lembro quando eu e a Sol acabamos com um grupo de garotas aproveitadoras. Na verdade, a Sol é boa de briga, eu só ajudava.

      — Não, Anna. Eu não tenho medo de frangas que se dizem mulheres.

— Frangas? Franga é sua avó, vadia de meia tigela! Volta para sua cidade! Com certeza essa deve ter muitos chifres.

Quando ouço isso, me dói o peito. Lembro de tudo que aconteceu antes de vir para cá e minha vontade é chorar. Mas me seguro, não vou dar esse gostinho à elas.

— Vai, Estela. Nos conte, como é ser traída? – fala Laís pondo fogo e logo todos estão gritando meu nome.

— Estela… Estela… Estela...

— Me conte você Stefanny. Já que além de ficar, eu moro com o GASTÓN! Também já tirei proveito, umas bitoquinhas, sabe? À noite, uma garota sozinha com medo da casa nova... Essa garota não deve dormir sozinha, não é?

Stefanny fica vermelha como um pimentão. Talvez, só talvez, eu tenha acertado em cheio a ferida. Posso até ver fumaça saindo de suas narinas. Sei que falei sem pensar, mas foi no calor do momento... E é exatamente, nesse calor do momento que vou apanhar

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