Havia chegado a hora de me unir a Atílio, medo, ansiedade e muitos outros sentimentos se misturavam dentro de mim. Mamãe me ajudava a colocar o vestido e arrumar os meus cabelos, eu pensava em como seria minha vida sem ela daqui para frente e eu tenho que desfazer quaisquer laços de dependência de agora em diante seremos apenas Deus e eu.
Senti as rendas daquele tecido passando as minhas mãos por ele, sabia que minha mãe havia feito um lindo trabalho.
– Ficou lindo mamãe, muito obrigada por tudo.
Ela não me respondeu.
– Mamãe? – Perguntou confusa com aquele silêncio.
– Perdoe-me filha, me emocionei ao te ver assim tão linda e pronta para começar sua vida.
– Não chore, por onde eu for sempre serei sua filha amada. A senhora e meu pai são e sempre serão a coisa que mais amo nesse mundo.
– Até que tenha os seus filhos, aí sim entenderá qual é o maior amor desse mundo.
– Não terei filhos com ele. – Guadalupe respondeu sem receio.
– Ainda com essa cisma?
– Não é cisma, apenas não quero me prender a um homem que cedo ou tarde pode dizer que não me quer mais.
– Meu amor, pense bem no que está dizendo...
Ouvem bater na porta.
– Posso entrar? – Era Leonel e estava ansioso para ver a filha vestida de branco.
– Sim papai, entre.
– Você está fabulosa, uma verdadeira princesa.
– Obrigada.
– Atílio mandou um carro para nos buscar Ester, e Sebastião já está te esperando lá fora filha Raio de sol também te espera e com uma sela toda enfeitada.
Guadalupe deu um sorriso modesto, estava prestes a mudar tudo o que conhecia. Viver em uma casa que não conhecia e com pessoas que não conhecia.
– Vamos então. – Ela pediu pegando na mão da mãe.
Eles saíram, Ester e Leonel entraram no carro seguindo para a fazenda na frente.
– Vamos Lupe? – Sebastião já a esperava com o cavalo preparado.
Guadalupe ficou em silêncio, estava se despedindo de sua casa e dos ares daquele rancho onde cresceu e foi tão feliz na infância. Gabriel surgiu por trás de Sebastião e o golpeou na cabeça com força deixando-o desmaiado no chão.
O cavalo rinchou assustado...
– Sebastião? O que aconteceu? – Perguntou ela aflita por aquele barulho.
Gabriel a pegou pela cintura, colocou sobre o cavalo montando em seguida por trás e agarrando as rédeas...fazendo o cavalo correr dali.
– Me perdoe Lupe, mas não podia te entregar nas mãos daquele monstro!
– O que está fazendo, por favor pare! – Ela suplicava.
Eu sabia que iriamos pagar caro pela loucura de Gabriel, Atílio iria nos seguir até o fim do mundo.
Atílio recebia os convidados em sua casa, estava elegante como nunca antes. Usava um terno alinhado de cor escura e o maior de todos os adornos, era a felicidade que estampava no rosto.
– Leonel e Ester, sei que fiz muitas coisas das quais não me orgulho especialmente ao senhor. Quero pedir perdão e dizer que amo, amo sua filha e farei tudo para que ela seja feliz ao meu lado.
Ester suspirou aliviada, agora podia confiar que estava entregando a filha a um homem que a queria bem.
– Tudo está esquecido, desde que ela esteja bem. – Leonel Avisou.
– Fui orgulhoso, mas essa noite e a confissão que fiz ao padre me fizeram refletir sobre como eu estava sendo injusto comigo mesmo e sobretudo com ela. Mas hoje ainda no altar eu direi o quanto a amo na frente de todos que estão aqui!
– Sim filho, sei que vocês podem e serão felizes juntos. – Ester sorriu.
O padre chegou, Amélia estava ajudando a recepcionar os convidados que se sentavam na parte externa.
Tudo estava enfeitado com flores naturais assim como ele havia pedido, algum tempo depois Sebastião chega com um ferimento na cabeça e cambaleando. Atílio sentiu que algo muito errado havia acontecido e ia correndo perguntar a ele passando pelo meio dos convidados.
– O que aconteceu, onde está minha mulher? – Atílio perguntou dando um chacoalhão em seu empregado de confiança.
– Aconteceu uma desgraça... – Sebastião revelou colocando a mão no ferimento e sentindo a dor.
– Calado, aqui não. Vamos para trás da casa e lá você diz. – Amélia levou os dois para dentro da casa, era melhor que os convidados não soubessem e ela pressentia o pior.
Atílio saiu puxando-o pelo braço nervoso, ansioso enquanto Amélia corria atrás dos dois e todos olhavam aquela movimentação estranha.
– Fala de uma vez. – Atílio intimou aos berros.
– Me golpearam na cabeça antes que eu a trouxesse para cá, caído no chão eu vi Gabriel fugir com ela no cavalo patrão.
– Não acredito que ela tramou com ele para me expor ao ridículo no dia do casamento. – Atílio cerrou as mandíbulas, seu rosto se avermelhou de raiva.
– Como sabe que ela foi por sua própria vontade? – Amélia questionou tentando acalmar os ânimos.
– Sim...ela sabe que mandei prender o pai dela, que vingança poderia ser maior do que me deixar feito um paspalho sozinho no altar? Mas eu mato, mato os dois agora mesmo! – Atílio gritou e Amélia não conseguiu impedir seu ataque de revolta.
– O que vai fazer? Por favor espere menino.
Atílio correu para dentro da casa, subiu as escadas feito uma bala. Abriu a gaveta do armário e pegou sua arma, conferiu bem rápido se estava carregada e antes de sair Amélia entrou em sua frente.
– Por Deus Atílio, deixe essa arma.
– Saia da minha frente Amélia.
– Sei que não vai machucar ela, mas se matar aquele rapaz perderá para sempre o amor dessa moça.
– A essa altura, pouco me importa o amor dessa maldita traidora! – Ele tirou Amélia da sua frente.
E saiu e nada o impediria de encontrar os dois, desceu e foi até um de seus carros. Sebastião abriu a porta do lado do motorista e entrou no carro...
– Eu vou ajudar o senhor a encontrá-los, não pegaram a estrada principal eu sei por onde ele foi.
– Então dirija! – Atílio segurava a arma com tanta força que parecia ser uma extensão de seu corpo.
Sebastião saiu acelerando, Amélia ficou encarregada de explicar o atraso ao padre e aos convidados.
– O que aconteceu? – Ester se aproximou para perguntar.
– Nada demais só iremos demorar um pouquinho mais do que pensamos.
– E Lupe, já chegou com Sebastião? – Ester olhava dentro dos olhos de Amélia, sabia que estava escondendo alguma coisa.
– Si...sim...só está lá dentro arrumando o vestido e alguns detalhes.
Ester sentiu uma angústia por dentro, algo estava errado.
Em fuga Gabriel e Guadalupe se afastavam da vila.
– Por favor Gabriel, vamos voltar. Atílio vai pensar mal de mim, por favor!
– Ele é um monstro, prefiro que me odeie toda a vida por ter te livrado das mãos dele. – Gabriel fazia o cavalo correr mais e mais.
Dentro do carro Atílio sentia sua boca secar, sua fronte pingar de suor e o medo invadir seu coração a cada metro que avançavam.
– Vou virar à esquerda patrão, há uma estrada de terra que os mercadores usam para levar as encomendas. Gabriel é antigo morador e sabe bem que o senhor não saberia disso!
Atílio gritava, e mandava Sebastião pisar fundo apesar de tudo o empregado temia o desfecho daquele encalço. Poucos minutos acelerando muito eles viram a poeira do galope do cavalo.
– É aquele filho da mãe! – Murmurou Atílio verificando o cilindro e se a arma estava devidamente carregada.
– Sim são eles, o que vai fazer senhor? – Sebastião olhou para o revólver assustado.
Atílio colocou o braço direito para fora da janela do carro, Sebastião suspirou e tremeu...
– Senhor, Lupe está naquele cavalo também!
– Eu sei. – Atílio respondeu.
Ele atirou no cavalo, que relinchou de dor caindo e derrubando os dois no chão duro daquela estrada de terra.
– Deus! – Sebastião gritou.
Ele olhou para Atílio que transpirava e ofegava, se aproximaram e Sebastião parou o carro bruscamente.
Ouvi o som de um disparo e senti meu corpo bater forte contra o chão, eu sabia que tinha sido Atílio. Me levantei cambaleando e sentia meus braços doerem muito.
– Filho da puta, achou que ia fugir assim tão fácil com ela? – Atílio veio com tudo para cima do rival.
Gabriel se levantou, assim como Guadalupe cheio de ralados dolorosos pelo corpo e sujo de terra.
– Vamos atire, se acha muito homem por estar com uma arma nas mãos. Vamos? – Gabriel encostou a testa no cano da arma engatilhada e apontada para sua cabeça, Atílio estava a ponto de acabar com a vida dele em fração de segundos.
– Se atirar nele juro por Deus, que te mato com minhas próprias mãos, Gabriel vá embora daqui agora! – Guadalupe implorou aos gritos, suja do sangue de seus ralados.
– Ainda tem a audácia de defender seu amante na minha cara?
– Não vou te deixar com esse monstro. – Gabriel relutou.
– Vai...agora! – Guadalupe gritou esbravejou.
O cavalo gemia de dor, Guadalupe apalpou o chão até sentir o pelo do seu melhor amigo. O abraçou sentindo sua respiração, que já estava fraca e sabia o quanto ele estava sofrendo.
– Termine de uma vez o que começou, acabe com o sofrimento dele! – Ele pedia abraçada a ele, a respiração do animal estava cada vez mais lenta.
– Afaste-a Sebastião.
Sebastião a ajudou a levantar, Atílio atirou no cavalo a adrenalina do corpo dela foi reduzindo trazendo com força as dores físicas e da alma. Naquele instante Lupe conseguiu chorar e expurgar toda a dor e revolta.
– Ele era os meus olhos a parte de mim que trazia autonomia e me fazia sentir igual as outras pessoas, agora tudo está escuro. Sua maldade me deixou cega Atílio! – Ela chorava desconsolada.
Sebastião olhou para o patrão que não esboçava qualquer reação pelo menos exterior, ele ainda estava furioso e tomado pelo despeito.
– Por favor Sebastião, me leve para casa! – Guadalupe pediu segurando na mão dele.
– De jeito nenhum. – Atílio respondeu ainda olhando para o cavalo e na direção em que Gabriel correu.
– Ela está machucada e suja para que a cerimônia aconteça hoje senhor.
– Vamos nos casar hoje de qualquer jeito, leve ela para o carro. – Atílio guardou a arma na cintura, ainda estava quente.
Pelo menos Atílio tinha a noção de que a última pessoa desse mundo que eu gostaria que me tocasse era ele, Sebastião me pegou no colo e fomos para o carro. Meus braços doíam muito e sei que sangravam por que eu sentia as escoriações.
Regressaram a casa, entraram pelos fundos para que nenhum dos convidados a visse chegar tão ferida e imunda.
– Chame Amélia rápido! – Atílio ordenou olhando para a esposa.
– Sim senhor. – Sebastião concordou e saiu bem rápido dali.
Atílio segurou forte no pulso de Guadalupe puxando-a para si.
– Achou que seria fácil se livrar de mim, assim como ele? Hoje Guadalupe se eu confirmar as suspeitas de que aquele verme te tocou, juro por Deus que mandarei trazer a cabeça dele em uma bandeja. – Guadalupe tentou puxar seu braço de volta, mas não conseguiu.
– Você é um monstro Atílio, não quero e não vou mais me unir a você depois do que fez. Eu tinha dentro de mim uma pequena esperança de que em ti houvesse alguma humanidade, mas eu estava completamente errada.
Ele a abraçou forte, Lupe gemeu de dor por seus ferimentos.
– Experimenta, me dizer não naquele altar. Você já sabe que mandei seu pai para cadeia. Ouse me dizer não! – Atílio gritava e apertava o queixo dela com violência, fazia seus rostos ficarem frente a frente.
– Atílio? Lupe, está machucada e suja o que aconteceu? – Amélia se aproximou preocupada.
Atílio a soltou, Guadalupe chorava compulsivamente.
– Lave os braços dela, estou indo Guadalupe e te espero na frente do padre e de todos, você tem 5 minutos! – Ele a intimou com um olhar desafiador.
– Vem comigo.
Amélia a levou para o banheiro, lavou seus braços ralados, deu um jeito no cabelo e lavou também seu rosto para esconder a muitas lágrimas.
Se Atílio queria me ferir eu precisava ir contra, mostrar força. Parei de chorar e me mostrar vulnerável depois de tudo, tenho que estar forte na frente dos meus pais ou irão sofrer ainda mais do que eu.
– Vamos Amélia. – Guadalupe se levantou da cadeira.
– Vou preparar um banho para você, não pode se casar assim e Atílio terá que entender.
– Ele disse 5 minutos e os convidados estão já estão me esperando.
– Está bem. – Amélia concordou.
As duas desceram as escadas e foram para a parte de fora onde os convidados aguardavam.
– Filha o que houve com seus braços e seu vestido? – Ester estava assustada ao ver a filha naquele estado.
– Nada demais mamãe, depois eu explico tudo para a senhora depois.
– Ela está machucada! – Diz o padre.
– Um pequeno incidente com o cavalo, mas nada demais padre. Vamos seguir com a cerimônia como estava programada. – Atílio só queria que aquilo acabasse de uma vez e fossem marido e mulher oficialmente.
– Sim, vamos seguir. – Guadalupe repetiu deixando o noivo surpreso.
– Está bem, em nome do pai do filho e do espírito santo....estamos aqui presentes, para unir no sagrado matrimônio Atílio Ribeiro e Guadalupe Hernandez.
Ele a olhava misturando ódio, amor, revolta e tantas coisas que o sufocavam por dentro. O padre deu as bênçãos iniciais, mas todos os convidados estranharam o estado em que a noiva se encontrava e a expressão séria de ambos.
– Atílio Ribeiro é de livre e espontânea vontade que decide se unir a Guadalupe?
Ele suspirou e olhou para ela profundamente.
– Sim padre!
– Guadalupe Hernandez é de livre e espontânea vontade que decide se unir a Atílio?
Não, não queria viver com aquele homem cruel e vingativo e toda esperança que eu tinha antes de ser feliz com ele, havia morrido com meu cavalo. Mas não queria que meus pais sofressem nas mãos dele.
– Sim, padre. – Uma lágrima de tristeza fugiu de seu olhar.
Os dois trocaram as alianças com as mãos trêmulas.
– O que Deus uniu, que o homem não separe pode beijar a noiva.
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