O Sheikh e Eu(Completo) romance Capítulo 25

– Moça? Já estamos preparando para o pouso. Se puder deixar a cabine do banheiro. – Pediu a aeromoça. Era uma mulher muito bonita de cabelos castanhos presos num coque e os olhos puxados em uma maquiagem bem pesada com olhinhos de gatinhos. Funguei mais uma vez. Não tinha aceitado comer nada o dia todo e, desde que partimos, estive trancafiada no banheiro, sentada no vaso, esperando que as horas amargas passassem e eu não precisasse olhar para a cara do Sheikh.

Na verdade, fiquei horas imaginando sua morte dolorosa, com minhas mãos o enforcando ou, quem sabe, com Seth morrendo subitamente atropelado por um ônibus. Sorri na maioria das vezes que imaginava essas coisas.

– Obrigada. – Disse. Agora deveria seguir para fora da cabine e me sentar esperando o pouso. Depois disso, para meu desagrado total, ainda teria que aguentar um Seth maldito por mais seis horas. Essa tortura parecia que não ia acabar nunca.

Meu rosto já não estava mais molhado, ainda que meu nariz estivesse muito entupido. Não havia marcas de choro, mas quando sai da tenda, a aeromoça, mulher e atenta como imaginei que era, pareceu perceber que eu estava chorando sem fazer som e me lançou um olhar cheio de piedade que eu não gostei. Não gostava que sentissem pena de mim. Ainda assim, lancei um breve sorriso para ela e me sentei a mais afastada que pude de Seth.

Ele pareceu nem perceber a minha presença.

Tudo bem que eu tinha ficado a tarde toda presa num banheiro claustrofóbico. Mesmo assim, Seth não se importava. Estava jogando algum joguinho esdrúxulo no celular, alheio ao mundo. Começamos a descer e eu voltei meu olhar para a janela absorvendo toda a imagem que me vinha a frente.

Era uma imagem de tirar o fôlego.

Passamos por uma cidade e seguimos ao aeroporto onde o jatinho pousaria. Mas não era longe. Contemplei as casas de telhado vermelho, as imensas catedrais que dividiam espaço na cidade e aquele lago, de azul límpido, que cortava a mesma. Tudo era tão lindo e mágico que eu não pude deixar de suspirar.

Fiquei a pensar se eu não estava sonhando. Sabe como é, brasileiro que nunca saiu do país, demora a acreditar que está em outro lugar. E eu ainda estava nesse torpor imaginável, absorvendo tudo o que eu podia com os olhos, esperando que a imagem ficasse presa na minha mente para sempre.

– É lindo, não é mesmo? – Ouvi e quase tomei um susto ao ver que Seth tinha mudado de poltrona e estava agora ao meu lado. Parecia muito relaxado, como se nada tivesse acontecido entre nós e eu fiquei pensando seriamente se o garoto não era bipolar. Por que só se for para querer conversar comigo depois de brigar comigo como uma criança mimada.

Decidi não encrencar com isso. Não valia a pena. Voltei meu olhar para a cidade que passava e me senti tão extasiada que só consegui dizer:

– É sim. – E Seth concordou balançando a cabeça. Tínhamos chegado na Suíça.

Não demorou para que saíssemos do jatinho. Tampouco para que fôssemos até a cidade que era ali pertinho. Tentei não olhar para Seth em nenhum desses momentos enquanto tentava parecer profissional como governanta, mas quando Seth saiu do jatinho, percebi que algumas pessoas ali presentes, o olhavam curiosas e logo compreendi porquê.

Me aproximei do mocetão rapidamente e arranquei a toalha da cabeça dele tirando assim, talvez, um pouquinho da raiva que ele tinha me feito passar no jatinho. Ele ainda me olhou como se eu tivesse feito um ultraje, mas eu não queria saber. Apenas suspirei e disse:

– Vai se trocar. Tente parecer.... Menos árabe, sabe? – Disse e Seth desatou em rir ao ver como eu estava encabulada com a quantidade de atenção que estávamos recebendo. Eu não gostava de atenção. E acho que ele já percebeu isso. Eu sempre podia transformar tudo num circo de horrores quando estava no meio de atenção por conta de roupas. Falar era fácil, mas agora, me julgarem por conta de um estereótipo social? Aham. Facinho.

– Quer sair com o Sheikh e não quer ser centro das atenções, Amira? – Ele perguntou risonho. Revirei os olhos. – Não é fácil assim. – Decidi que estava pouco ligando agora para convenções. Talvez por que estivéssemos no ocidente agora. Talvez eu me sentisse um pouco menos encabulada diante da não presença do mundo muçulmano. Fosse o que fosse, não me importei ao tocar minhas mãos no ombro de Seth enxotando ele para qualquer banheiro por perto.

– Sho, Sho. Vai se trocar. Se vou ter que te aturar como você disse, que ao menos você me ouça. – Disse e Seth cruzou os braços, virando-se de frente para mim, subitamente. Estávamos parados de frente um com outro e eu não pude deixar de imitá-lo cruzando os meus braços também.

– O que foi? – Perguntei já irritada. Seth riu.

– Você irritadinha. – Revirei os olhos.

– Quer parar de brincar e ir trocar de roupa, Riquinho? – Pedi colocando minhas mãos nos seus ombros novamente. Ele negou com a cabeça com um sorriso travesso nos lábios.

– Quero pedir desculpas. – Dessa vez eu o soltei mortificada. Na verdade, sem acreditar. Quase passei a rir.

– Que tipo de brincadeira é essa? – Perguntei e Seth ficou sério. Dessa vez, ele parecia não estar mais brincando.

– Estou falando sério. Você tinha razão. Fiquei a pensar. E depois que eu vi que os empregados te elogiaram para minha mãe, e ela te mandou uma mensagem no celular, eu... –

– Como é que é? – Perguntei cortando Seth. Ele falava tão calmamente que além de adicionar o meu namorado, ele tinha mexido no meu celular, que eu não sabia se o enforcava agora ou esperava para ver do que mais ele era capaz. Quem em sã consciência faz uma bosta e pede perdão pela mesma, mas faz outra logo em seguida?

– A questão é. – Seth me cortou e sua voz demonstrava relativa fúria. Ele não gostava de ser cortado. Estava no seu olhar. – A questão é que eu não fui correto nas minhas ações. E vou tentar passar a me comportar, porque devo isso a você e a minha mãe. Ser um Sheikh melhor. Você está fazendo o seu trabalho e é sempre responsável e, ultimamente, eu só venho sendo responsável na minha vida laboral. De agora em diante, não maltratarei mais ninguém, senhorita Agnes. Por isso, peço que me perdoe. – Uau. Isso era um grande avanço vindo do Sr. Mimado que Seth era. Eu ainda tentava compreender o que ele estava dizendo quando Seth continuou a falar: – E eu só vi na tela de bloqueio a mensagem da mãe. Não abri a mensagem. Mas você deveria tomar mais conta do seu celular. Perdeu três ligações de Matheus. – Ele comentou naturalmente.

Meus lábios se estenderam e eu tentei formar uma frase que fizesse sentido. Óbvio que não consegui. Depois lembrei que Seth tinha visto o meu celular e meu coração palpitou. Por fim, senti uma pontada de dor de cabeça. No que eu estava me metendo, Senhor?

– Tudo bem. – Disse ainda mortificada. – Eu te perdoo. – Continuei e passei a procurar na minha bolsa o meu celular. Precisava ver tudo o que eu tinha perdido enquanto continuava a choramingar no banheiro. De repente, parecia até infantil tudo o que tinha acontecido no jatinho.

– Então, enquanto você fica aí, eu vou trocar de roupa, senhorita irritadinha e mandona. – Ele disse e eu revirei os olhos enxotando ele com a mão.

Quando Seth fugiu para dentro do banheiro masculino, eu só pude sentar no primeiro banco que encontrei pela frente e abrir o meu celular.

Seth estava certo. Eu tinha perdido muito do mundo.

Primeiro, não esperei muito e já liguei para Matheus. A minha internet estava funcionando bem – graças a Deus, Zurique era um lugar bom para internet – e esperei que Matheus não me matasse por que eu tinha perdido três ligações dele.

– Alô? – Ele disse e eu sorri do outro lado da ligação.

– Math, me desculpe. – Pedi e percebi o quão desolada eu parecia assim. – Acabei tendo alguns problemas e esqueci de ver o celular. – Respondi e Matheus riu.

– Você sempre foi assim com o celular, amor. Eu já sabia. Não se preocupe. Está tudo bem? – Voltei meu olhar para o banheiro. Nada da presença do Sheikh. Mas eu precisava ser rápida.

– Está tudo ótimo. Estou correndo um pouco. Mas você não se importa, não é? Está arrumando as coisas para vir me ver? – Matheus concordou e parecia eufórico.

– Eu vou tirar uma foto para você e você me diz o que acha que eu devo levar. Tudo bem? – Não sabia como isso ia funcionar, mas dei de ombros.

– Tudo bem. – Mais um olhar para o banheiro. Nada da presença do Sheikh. Ainda bem.

– Então beleza. Vou me adiantar aqui amor. Bom trabalho para você. – Ele disse e eu concordei.

– Obrigada Amor. Boa arrumação para você também. – Respondi e desliguei.

Parecia que um peso enorme tinha saído das minhas costas e eu não conseguia compreender se esse sentimento era bom ou ruim. Afinal, ter uma sensação de paz depois de desligar do namorado era normal? Porque eu me sentia me livrando de um peso. Ou talvez fosse a culpa me corroendo. Eu deveria ter contado para Matheus que estava com Seth, que estava indo com ele. Eu estava omitindo as coisas dele, eu sei. Contudo, não conseguia sentir vontade de falar disso. Poderia me encrencar muito por conta disso, mas eu confiava que Deus fosse cuidar um pouquinho do meu destino e que, somente dessa vez, esses percalços não dessem errado.

Voltei meu olhar novamente para o celular. Agora era a vez da Senhora Zilena. Olhei para o celular enquanto via uma mensagem dela. Era no Whattsaap. E eu nem me lembrava que a Senhora Zilena tivesse ou que ela tivesse pedido o meu número. Dei de ombros. Família estranha. Seth arrumava uma maneira de descobrir o nome do meu namorado, o que seria um número de celular para eles, não é mesmo?

Avistei a mensagem de Zilena. Ela não tinha foto no celular. Mesmo assim, não pude deixar de sorrir e ter meus olhinhos brilhando enquanto lia pela segunda vez a mesma mensagem:

“Srta. Agnes,

Os empregados me elogiaram muito sobre a senhorita.

Eu acho que fiz uma escolha certa. Uma amiga, finalmente, para cuidar tão perfeitamente das minhas coisas. Fico muito feliz por isso, Agnes.

Seth me contou que iria ver o seu namorado. Os guardas são para a segurança do Sheikh, mas para as suas também, querida. Afinal, agora além de uma governanta, você demonstrou ser uma aspirante adorável a amiga.

Com amor, Zilena.”

Fiquei a contemplar a mensagem mais uma vez ainda revivendo cada letra da mensagem. Não sabia o que dizer, não sabia o que pensar. Só conseguia ter gratidão com a Sra. Zilena. Ela também, estava sendo uma senhora magnífica na qual me inspiraria para sempre.

– Interessante a mensagem. Minha mãe agora tem uma amiguinha. – Brincou Seth e eu ia empurrar o seu ombro revirando os olhos pelas atitudes sempre brincalhonas do homem, quando olhei o mesmo e fiquei um tempo sem fala.

Seth estava com uma calça jeans que era larguinha e também um casaco preto grosso. Além disso, estava com um cachecol amarelo mostarda que muito ressaltava os olhos dele deixando-o ainda mais sexy. Mantinha as mãos no bolso e estava com o cabelo um pouco maior do que costumeiramente deixava, os fios se levantando conforme o vento passava.

Okay. Fiquei sem ar. Mas tenho certeza que qualquer uma no meu lugar ficaria também. E ainda tinha o maldito do Matheus. Por que ele não estava aqui para impedir que eu me sentisse assim... Estranha?

– Melhor para você, chatinha? – Me perguntou Seth brincalhão. Dei de ombros fingindo que não tinha percebido até então a sua presença marcante e sexy ao meu lado.

– Menos árabe, menos reconhecível nas ruas. – Disse e ele pareceu achar graça.

– Vamos então. – E seguimos.

Estava um pouco frio e eu agradeci mentalmente a Sahir por ter me feito usar um casaco no calor que estava em Omã. Agora, eu estava vestindo uma calça jeans larguinha também e uma blusa azul escuro, junto de um casaco quentinho também azul.

Seguimos até a cidade então. Ali pegaríamos um carro alugado e íamos até Munique. O sol já despontava no horizonte e eu me peguei pensando que horas eram porque estava faminta. Alegando ainda mais o fato, o meu estômago roncou levemente e Seth gargalhou.

– Está com fome, Agnes? – Preferi não cair na provocação dele.

Mal chegamos a cidade e respirei aquele ar gélido. Seth então pareceu ter uma ideia porque começou a andar pelas ruelas minúsculas e eu fiquei alarmada. Quer dizer, não falava alemão tão bem assim. Não conhecia muito do que estava escrito no letreiro e, pior, Seth estava me largando ali sozinha. Subitamente, o medo me percorreu por inteira e eu fui tomada por uma sensação angustiante tomando conta de mim.

– Seth! – Gritei. – Me espera! – Novamente. As pessoas ao redor me olharam como se eu fosse a estranha por gritar na rua e eu só pude pensar em matar Seth enquanto corria ao encontro do moço que se movimentava com uma destreza e rapidez genuína. Demorei a compreender o que ele estava fazendo até nos encontrarmos de frente a um hotel e eu respirar aliviada. Ele não estava me levando a um beco para me matar. Super compreensível agora.

– Já disse que as vezes você é insuportavelmente irritante? – Ele perguntou enquanto adentrava o hotel. Dei de ombros. Não ligava.

– O que vem debaixo não me atinge. – Disse e Seth passou a me tirar do sério.

– Mimimi. – Disse e gargalhou.

– Pare já com isso Seth! – Mas mandei do que pedi. Aquele mimimi todo estava me dando nos nervos.

– Boa noite. – Disse Seth num alemão perfeito me ignorando para fazer o nosso check-in. Arqueei uma sobrancelha. Então além de tudo, Seth sabia falar Alemão? O que mais ele não sabia? Fiquei pasma.

– Boa noite. – O homem respondeu e eu tive que me esforçar muito para compreender o que ele estava falando: – ... Quartos? – Foi a única palavra que consegui compreender.

– Dois. – Respondeu Seth. Talvez por eu já estar acostumada com a entonação de voz de Seth, ou talvez por que ele estivesse falando mais devagar que o homem, eu conseguia compreender o que ele falava.

– Certo. – Respondeu o homem que estava ali. Ele estava de terno e parecia muito sério com os cabelos grisalhos e os olhos sombrios. – Quartos 50 e 51. – Respondeu o homem e entregou a chave para Seth. Ele aceitou de bom grado e deu uma para mim. Concordei enquanto pegava a chave do meu quarto. A verdade é que eu não via a hora de tomar um banho quentinho e colocar uma roupa mais quentinha ainda.

– Acho melhor não pegarmos estrada a noite. – Confessou Seth e eu concordei, claro. Na verdade, não gostava de pegar estrada, então, quanto mais pudesse adiar, melhor. – Vamos tomar um banho e depois jantamos. Tudo bem? – Me perguntou Seth, educadamente. O Seth cortês tinha voltado e eu gostava dele.

– Certo. – Concordei e seguimos para o elevador prontos a pegar o último andar daquele hotel. Ainda não estava acreditando que estava na Suíça. Acho que demoraria até que eu me acostumasse.

– Daqui uma hora? – Me perguntou Seth quando parou em frente à porta dele. Meneei a cabeça numa assertiva.

– Uma hora. – E entrei também no meu quarto.

Era um quarto simples, mas muito reconfortante e convidativo. Havia uma cama de casal com lençóis brancos e alvos e um papel de parede que parecia um rosa salmão muito clarinho com flores desenhadas nele. Havia também um guarda roupa pequenino e uma mesinha no canto onde depositei minha mala e minha bolsa. Não pude deixar de me jogar na cama.

Estava exausta.

Ainda me sentia num sonho e temia que se acordasse dele poderia sonhar com os pesadelos que eram a vida real. Contudo, naquele momento, pelo menos, eu não queria pensar no mal. Tentei expulsar as ideias horripilantes da minha cabeça. Como meu pai. Como o câncer. Como a falta de dinheiro. Enfim, como todas as coisas que só me davam dor de cabeça.

Eu queria apenas paz.

Continuei pensando nisso até o momento que percebi que o sol que ainda existia tinha sumido e que eu precisava tomar um banho para me encontrar com Seth para jantar. Enquanto eu pudesse aproveitar o sonho que estava sendo viajar por ali, eu aproveitaria. Os problemas? Bem, os problemas que ficassem para depois. Após a bonança, eu me preocuparia com a tempestade.

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