Entre tantos armários amontoados na sala, vou até um que parece um barzinho. Vejo então várias garrafas de uísque novas, e vários copos embalados. Pego a garrafa e a abro.
Determinada, vou até ele.
— Hassan.
Ele abre os olhos, e quando vê tudo na minha mão me dá um sorriso fraco.
— Desinfete com o uísque o abridor de cartas e depois meu ombro. Então, mãos à obra e retire a bala.
Eu tremo muito.
— Eu acho que não vou conseguir — digo, angustiada.
— É claro que vai. Você é forte. Não sabe a força que tem.
Eu o olho com descrédito. Ele procura minhas mãos trêmulas e as aperta com sua mão.
— Vamos fazer uma coisa de cada vez. Está certo?
Eu aceno um sim.
— Primeiro me dê a garrafa! — ele pede.
Eu dou a garrafa de uísque para ele. Hassan então bebe bastante do uísque e limpa a boca com a manga da camisa. Eu estremeço, pois entendo seu gesto. Ele está se preparando para a dor que irá sentir e se anestesiando.
Ele me entrega a garrafa.
— Agora me ajude a retirar a camisa.
Ofego, com medo de não conseguir retirar a bala. Levo minha mão até sua gravata, a afrouxo e a passo por sua cabeça.
Fecho meus olhos e respiro fundo, e de botão a botão vou despindo-o. Seu lindo peito forte e peludo vai sendo revelado. Ajudo Hassan a tirar a camisa. Vejo o grande buraco na sua carne, mas não consigo ver bala nenhuma.
A polícia continua a falar com os bandidos, dá para ver que eles estão exaltados lá no salão, e ouvimos um tiro.
Mais uma morte? Ou apenas um aviso?
Deus! Acho que vou desmaiar.
— Beba! — Hassan me dá o uísque quando me vê pálida.
Eu respiro fundo e faço como ele me disse, bebo do uísque. Tusso quando ele arde na minha garganta.
— Chega! — ele sorri fraco. — Você precisa estar bem para tirar a bala.
Eu aceno um sim para ele.
— Boa menina — Hassan diz, com um sorriso de aprovação.
Ele pega a garrafa de minhas mãos e joga no ferimento, soltando um palavrão em árabe. Aperta os olhos e as mãos no sofá quando sente toda a região arder.
— Hassan, tem certeza de que quer que eu faça isso? A polícia está aí. Logo seremos resgatados.
— Isso leva tempo e não podemos esperar.
Eu derramo uma lágrima.
— Está certo.
Hassan se emociona. Seus olhos se enchem de lágrimas.
— Perdoe-me por te fazer passar por isso. Consegue me perdoar? — ele diz arrastado.
Eu o olho ternamente.
— Não tenho nada para perdoar. Você não imaginava que isso fosse acontecer — digo, e passo a mão nos cabelos dele, afastando de sua testa molhada de suor.
Hassan pega a minha mão e a beija, então me puxa e nossos lábios se abrem e nossas línguas se acariciam, envolvidas em uma dança suave e exploratória. Esse beijo é suave e romântico, mas com uma disposição que evoluiria para quente e excitante se não fosse a situação. Ele então me afasta, seus olhos parecem duas chamas de fogo.
— Lamento quebrar nosso beijo, mas agora faça o que tem que fazer. Um aviso, caso eu desmaie, não se desespere, é normal que isso aconteça.
Então ele olha para o armário contra a porta.
— Melhor empurrar o sofá, caso eu desmaie pelo menos sou um peso a mais caso eles tentem forçá-la.
Ele nem sabe que passei por isso sozinha quando ele estava desfalecido. Eu estremeço com a lembrança e dou um aceno de cabeça para ele.
— Boa ideia.
Ajudo Hassan a se levantar. E empurro o sofá no piso de madeira. O colocamos em frente ao pesado arquivo. Hassan então se deita no sofá, faz um bolo com a camisa e a coloca entre os dentes.
Com as mãos trêmulas, jogo uísque no abridor de cartas. E olho para o ferimento. Ofegante, me sento ao lado dele e encaro o ferimento novamente.
— Vocês estão cercados — ouvimos a polícia novamente.
Eu estremeço e paro o que estou fazendo. Hassan vira meu rosto para ele e tira a camisa da boca. Seus olhos negros são duros sobre os meus:
— Karina. Foco. Não se preocupe com eles — ele diz, e coloca a camisa entre os dentes novamente.
Eu aceno um sim e respiro fundo. Tremendo muito, insiro a ponta do abridor e começo a cavoucar a carne, sem olhar para o rosto de Hassan, que se contorce de dor, mas ver seu rosto é pior, e eu não vou conseguir acabar logo com isso.
A bala está funda na carne. Eu posso senti-la. Vejo que, pressionando a carne para o lado, consigo forçá-la a sair. O sangue aumenta quando começo a trabalhar para isso. Meu estômago revira, mas fico firme. Minutos depois, com muita dificuldade, ela vem à tona. Sorrio entre lágrimas quando consigo tirá-la.
Os braços de Hassan caem, e eu o olho. Ele está desacordado, e branco como papel.
Tadinho…
Pego a bala e a coloco dentro do lenço, e jogo uísque na carne novamente. Hassan geme, mas não volta a si. Tiro a camisa de sua boca e pressiono seu ferimento, tentando fazê-lo fechar e estancar o sangue.
Fico assim, pressionando. Quando acho que foi o suficiente, tiro a camisa. Funcionou.
Respiro fundo.
Passo os olhos pelo local e verifico se tem telefone, mas não acho nenhum, e, pela aparência da sala, parece guarda-treco. Tem várias cadeiras amontoadas em um canto, armários novos e alguns mais velhos. Um grande espelho, uma estátua, vasos…
Os minutos passam e ele não acorda, mas percebo que sua respiração e temperatura estão normais. Meus olhos passam por Hassan. Observo seus ombros largos, seu peito peludo e forte.
Deus! Como ele é lindo.
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